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Embarcador e Operador: o que permeia essa relação?

Embarcador e Operador: o que permeia essa relação?
20/05/2016

O Núcleo GVcelog (Centro de Excelência em Logística e Supply Chain) da Fundação Getulio Vargas, em parceria com a Abralog (Associação Brasileira de Logística), promoveram, nesta quarta-feira (18) um encontro entre pesquisadores e profissionais de logística para discutir a relação entre a confiança e a performance nas negociações entre o embarcador e o prestador de serviços logísticos. Apresentado pela professora da FGV e pesquisadora do GVcelog, Priscila Laczynsky Miguel, o evento abordou não apenas as relações de confiança como também parâmetros de elaboração de contrato e as nuances presentes na escolha pelo gestor de logística.

Autor da pesquisa, o doutorando pela FGV, Claudio Minerbo, explicou que vem estudando a área de outsourcing há duas décadas, mas resolveu formalizar a pesquisa em 2015, após perceber que a questão do relacionamento é algo mal resolvido no que tange à flexibilidade para andamento dos processos, com impacto na performance das empresas. Basicamente, a Minerbo pretende responder a três perguntas. O que significa a confiança entre o cliente e o prestador de serviços? Essa confiança impacta de fato a performance? E, por fim, pode haver diferenças nos resultados das empresas de acordo com os níveis de percepção dessa confiança?

Luiz Ricardo Marques Pedro, conselheiro da Abralog, que comanda o núcleo da associação responsável pela gestão do Comitê da Indústria de Consumo e Varejo, especialmente em sua relação com os prestadores de serviços logísticos, teve participação na pesquisa, assim como a publicação Painel Logístico, convidando os leitores e associados a compartilhar suas experiências práticas. A todo, foram 148 empresas entrevistadas, das quais 73 eram embarcadores, e 75, operadores logísticos de setores variados, como bens de consumo, automotivo, distribuição, químico, eletro-eletrônicos, entre outros.

“Esta é uma relação que vem crescendo no país, e o setor tem buscado especialistas para estudar o seu funcionamento, de modo a ganhar em produtividade”, afirmou Luiz Ricardo, lembrando ainda que esse tipo de relacionamento tem que “nascer muito bem: deixar muito claro o que um espera do outro, quais são as especialidades de cada envolvido”.

Minerbo explica que a confiança se dá com base em expectativas ou na percepção, por meio de quatro dimensões não tangíveis, mas que produzem resultado efetivo no desempenho da parceria: honestidade, benevolência, credibilidade, competência. E conclui que existe, sim, uma relação comprovada entre confiança e performance entre empresas, uma vez que elas ficam entremeadas nos relacionamentos e os permeiam por longo prazo, reduzindo males prejudiciais ao resultado final, como o oportunismo e as tendências para “tirar vantagem”, que inibiriam a coragem para se desenvolver uma ação.

Entre as descobertas de Claudio Minerbo, destacam-se particularidades, como a queda da percepção de confiança em contratos de mais longa duração, ou a indiferença dos valores de contrato sobre a confiança entre parceiros. O doutorando destacou também que existe uma diferença de percepção entre as partes no que tange à confiança: o fornecedor sempre enxerga que desfruta de mais confiança do que o cliente realmente declara ter sobre ele, ou seja: o cliente é sempre mais crítico em fatores como confiança, benevolência, honestidade, competência, credibilidade – e especialmente na performance, que é o único item de fato tangível. “O fato é que, como sou engenheiro, tenho a tendência de transformar essas relações em operações matemáticas e essa é uma multiplicação de produtos, ou seja: se qualquer um dos componentes inexistir, ele pode imediatamente zerar a confiança”, brincou o (também engenheiro eletrônico) pesquisador.

A questão primordial, no entanto, é que “o embarcador quer mesmo é performance, e não está interessado em que haja diferença na percepção de confiabilidade”, aponta o pesquisador, o que o leva a outro ponto importante: “no Brasil, há um excesso de informalidade – uma baixa cultura de confiança”, diz Minerbo, lembrando que, em ambientes mais complicados como o brasileiro, há necessidade de contratos mais bem-feitos. “As relações no Brasil são exageradamente pautadas no relacionamento, uma mistura entre o pessoal e o profissional que exacerba a tolerância à informalidade e acaba gerando pressões por custo, com consequente diminuição de investimentos em tecnologia, discussões baseadas mais em sensações do que em resultados e relações mais baseadas em dependência do que em parceria”, alerta.

A proposta de Claudio Minerbo para trabalhar as relações de confiança em prol das organizações – tanto do lado da prestação de serviços quanto do lado do cliente tomador – é estar sempre consciente, entender a medida com que se deve primar pela flexibilidade, qualidade, custo etc., além de comunicar-se de maneira mais eficaz para reduzir diferença de percepção, e ter proatividade para aumentar o alinhamento entre as partes. “O relacionamento entre empresas é como o casamento, se os dois não tiverem a boa vontade – e a proatividade –, por fim, haverá o divórcio”, conclui.

Highlights do debate entre embarcadores e operadores:

Fábio Vivas – Danone: Embora tenha estado do lado do operador durante anos na carreira, Fábio Vivas hoje vive a realidade do embarcador, como Gerente Nacional de Logística da Danone – Divisão early life nutrition. Ele endossa as teorias levantadas por Claudio Minerbo em sua pesquisa de doutorado, porém ressalta que é importante se ater ao processo de qualificação de fornecedores: “É preciso saber o que se está buscando, compreender as diferenças de escopo, definir inclusive a matriz de riscos que você pretende correr”, explica.

Rodrigo Bacelar – Penske: A percepção do Gerente Comercial de Consumo e Varejo da Penske Logística é de que o mercado vem buscando maturidade, afunilando as empresas que o operam, por meio de relações comprometidas com a qualidade, a eficiência e alavancas de redução de preço. “Para isso, é necessário trabalhar a formalização”, afirma Bacelar, que brinca que hoje, a área comercial é formada por grandes “psicólogos”, permeada pelas relações interpessoais. “Isso prejudica quando se mistura ao dia-a-dia do trabalho, diferente das tendências do mercado europeu e americano, que dão muito mais atenção à formalização”. Ele diz ainda que a confiança é algo que se constrói até mesmo antes do relacionamento diário: “desde o momento em que a gente recebe o bid, é preciso dar uma satisfação, se é viável, indicar onde há sinergia, ser transparente, ético, mostrar confiança e credibilidade, até mesmo quando é o caso de declinar – porém tudo precisa ser transformado em contrato”, enfatiza.

Luiz Ricardo Marques – Abralog: As questões de contrato são mais facilmente discutidas quando se trata de grandes empresas, com políticas de compliance. “O fato é que há muitas empresas de médio porte que nunca terceirizaram a gestão logística, mas que, em função de competitividade, têm buscado operador logístico. Da mesma forma, há uma série de empresas que se auto intitulam operadores, algumas delas exercendo a atividade, porém que são focadas em somente algumas especialidades, enxergando no cliente a sua chance de abrir o escopo de atividades”, exemplifica Luiz Ricardo, que afirma que daí nascem as relações “erradas”, por não deixarem claro o que um espera do outro. De acordo com ele, existem dois mundos: o das grandes empresas, permeadas por políticas de compliance, porém sem flexibilidade. E o das empresas pequenas e médias, que nascem da derivação de transportadores, oferecendo mais flexibilidade, porém muita informalidade. “É preciso entender o que o cliente espera do operador e o que o operador espera do cliente”, afirma o conselheiro da Abralog.

Priscila Miguel – GVcelog: contribuindo com as questões sobre o relacionamento entre o cliente e o prestador de serviços, a professora e pesquisadora da FGV explica que, quando há uma assimetria de poder entre cliente e fornecedor, a relação de confiança é afetada, uma vez que “aquele que é mais fraco deposita uma expectativa muito grande no outro, sente a necessidade de se colocar, e a parte mais fraca investe muito para mostrar atratividade, se tornar mais atraente e ganhar a confiança”. Nessa relação, ela pondera que há uma tendência de que aquele que tem mais poder tome uma postura de afastamento, mantendo o lado técnico, ou seja: cada parte cria uma expectativa diferente, o que pode ser prejudicial para ambas.

Fonte: Guia Marítimo